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segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Insetos com vontade de viver - açôes integradas de controle

O uso indiscriminado e não-planejado de inseticidas permite o desenvolvimento de populações de insetos resistentes aos produtos; para o controle, precisa-se de ações integradas.

Os insetos habitam o mundo há cerca de 400 milhões de anos; enquanto o homem o habita por apenas dois milhões de anos. Assim sendo, verifica-se que os insetos tiveram cerca de 398 milhões de anos a mais que nós para se adaptarem com muito mais adeqüabilidade às condições do nosso planeta. Eles possuem eficientes mecanismos de contraposição ao amplo espectro de condições adversas a que estão sujeitos, o que tem permitido sua sobrevivência por período tão longo de tempo. Um dos efeitos da versatilidade desse grupo de animais é o desenvolvimento de resistência a compostos que são normalmente utilizados para combatê-los – os inseticidas.



Nos últimos 50 anos houve drástica transição, tanto na área médica quanto na área agrícola, para uma grande dependência do uso de agentes tóxicos desenvolvidos para o controle de organismos indesejáveis. Inseticidas, por exemplo, são de uso corriqueiro na agricultura visando o controle de insetos-pragas e certas culturas como tomate e algodão, só para citar algumas, são extremamente dependentes da utilização de tais compostos. A resposta ao uso intenso de inseticidas vem sendo traduzida em um constante incremento do número de populações de insetos resistentes a inseticidas. Esse fenômeno é definido, pelo Comitê de Peritos em Inseticidas da Organização Mundial de Saúde, como o desenvolvimento da capacidade, por uma população de insetos de dada espécie, de suportar doses de inseticidas que seriam letais para uma população normal de organismos da mesma espécie.



Histórico e conseqüências



O primeiro relato de resistência a inseticidas ocorreu no estado de Washington (Estados Unidos) já em 1908, quando A.L. Melander relatou a ocorrência de uma população de piolhos-de-São José, Quadraspidiotus perniciosus, resistente ao enxofre. Tais estudos somente se intensificaram após a introdução e disseminação do uso de inseticidas organossintéticos a partir de meados da década de 1940. Em um dos últimos relatos que se tem a respeito, ainda do início da década de 1990, foram estimados em 504 o número de espécies de insetos e ácaros resistentes a pelo menos uma classe de praguicidas.



No Brasil por sua vez, os primeiros relatos de populações de insetos resistentes a inseticidas datam do final da década de 1960 graças ao esforço pioneiro da Dra. Esmeralda Mello, do Instituto Biológico. Esses estudos, contudo, não foram objeto de maiores atenções no país até relatos mais recentes de falhas de controle acontecidas na proteção contra insetos em grãos armazenados, pomares e hortas. Caruncho-do-milho (Sitophilus zeamais), besourinho-dos-cereais (Rhyzopertha dominica), traça-do-tomateiro (Tuta absoluta), bicho-mineiro-do-cafeeiro (Leucoptera (=Perileucoptera) coffeella), mosca branca (Bemisia tabaci, raça B), traça-das-crucíferas (Plutella xylostella), lagarta-do-cartucho-do-milho (Spodoptera frugiperda), ácaro-da-leprose-do-citros (Brevipalpus phoenicis), e curuquerê-do-algodoeiro (Alabama argillacea) são algumas espécies de insetos-pragas da agricultura que vem sendo mais intensamente investigados no Brasil quanto à ocorrência de populações resistentes a inseticidas graças, dentre outras coisas, ao esforço dos poucos pesquisadores brasileiros que atuam na área e ao incentivo que tem sido dado pelo Comitê Brasileiro de Ação a Resistência a Inseticidas (IRAC-BR), fundado em 1997. Espera-se que no futuro próximo o leque de espécies estudadas aumente, assim como as possibilidades de financiamento para tais estudos.



As conseqüências primárias do surgimento de populações de insetos resistentes a inseticidas são: 1) aumento da freqüência das aplicações de inseticidas, 2) aumento da dose do produto aplicado e 3) sua eventual substituição por outro composto. Em termos financeiros, o preço da resistência a inseticidas, estimado a partir de perdas de colheita e elevação do custo de controle de insetos, é assustador. Ele atinge a cifra de US$ 1 bilhão nos Estados Unidos, apenas no controle de lagartas e besouros. Outro custo envolvido acontece quando um inseticida torna-se ineficaz, devido à resistência, podendo ser considerado perdido para sempre. Tal fato compromete um investimento superior a US$ 120 milhões no desenvolvimento de uma nova molécula inseticida atualmente, além de um período de 10 anos desde a sua concepção até sua comercialização.



Desenvolvimento da resistência



Quando se aplica um inseticida para controlar uma praga, normalmente a maioria dos indivíduos morre. Estes indivíduos que morrem são suscetíveis ao inseticida. Todavia, alguns insetos estão naturalmente aptos a resistir e sobreviver à dose do inseticida aplicada. Estes indivíduos são resistentes. Na próxima geração será maior a proporção de indivíduos resistentes na população, que por sua vez gerarão uma proporção maior de indivíduos também resistentes, enquanto mais indivíduos suscetíveis serão vitimados por novas aplicações inseticidas. Ao fim de algumas gerações desenvolvidas sob aplicações inseticidas ter-se-á potencialmente uma população de insetos virtualmente resistente a estes, pois os indivíduos resistentes serão predominantes nela em relação aos suscetíveis.



Assim, depreende-se que o desenvolvimento da resistência a inseticidas é simplesmente uma conseqüência da seleção natural sendo o inseticida o agente de seleção. A evolução da resistência é determinada pela pressão de seleção exercida pelo inseticida sob a população de insetos, sendo dependente principalmente de três fatores: 1) biologia da praga, incluindo a taxa reprodutiva, a migração e o espectro de hospedeiros dela; 2) a persistência e a especificidade do inseticida; e 3) a intensidade de uso do produto, incluindo a dose, número e épocas de aplicação.



Manejando a resistência



É indiscutível a grande habilidade com que os insetos se adaptam a diferentes agentes de controle. Sendo assim, é importante definir como determinado inseticida deve ser utilizado para que a resistência a ele não se torne um problema. Isso é conseguido através do manejo da resistência que envolve um esforço interdisciplinar com o objetivo de prevenir, retardar ou reverter a evolução da resistência em insetos-pragas e promovê-la em inimigos naturais.



Estratégias de manejo da resistência podem ser divididas em três grupos: 1) manejo por moderação; 2) manejo por saturação; e 3) manejo por ataque múltiplo. O manejo por moderação baseia-se na redução da pressão de seleção para preservação de insetos suscetíveis na área. Suas recomendações são uma extensão das recomendações genéricas de manejo integrado de pragas. Aplicação menos freqüente de inseticidas, limitação da área de controle quando possível (i.e., controle apenas em “reboleiras”), manutenção de áreas não-tratadas para fins de refúgio de insetos suscetíveis e aplicação de inseticida contra o estágio mais vulnerável da praga são algumas recomendações de manejo por moderação.



O manejo por saturação tem por objetivo reduzir a persistência dos insetos resistentes na área e se baseia na utilização de altas doses de inseticidas. Essas altas doses permitem a sobrevivência apenas de insetos resistentes que então se acasalam com insetos suscetíveis que migram para a área “diluindo” a resistência. O manejo por ataque múltiplo envolve a utilização de dois ou mais produtos em rotação ou misturas. Os produtos em misturas podem ser dois inseticidas ou uma mistura entre inseticida e sinergista, sendo este último um composto que em doses subletais eleva a eficiência do inseticida. A rotação, por sua vez, é sempre entre inseticidas e se baseia no uso alternado, de produtos distintos, contra determinada praga. Como o uso de misturas é controverso e não tem suporte na legislação brasileira de pesticidas, o uso de inseticidas em rotação é uma medida de manejo mais recomendada até por seu menor custo de utilização.



Provavelmente o grande desafio do momento está na implantação das estratégias de manejo em agroecossistemas diversos. As dificuldades na implantação dessas, além das inerentes à falta de pesquisa, envolvem: 1) necessidade de esforço conjunto entre agricultores, indústria e pesquisadores; 2) realização de experimentos em larga escala e por período prolongado de tempo; 3) alta mobilidade de algumas espécies-pragas, como a lagarta-do-cartucho-do-milho e a traça-das-crucíferas, requerendo cooperação regional; e 4) regulamentação do uso de pesticidas. Para encerrar esta breve abordagem sobre a resistência a inseticidas, farei uso de uma advertência que vem sendo veiculada pelo IRAC-BR em seu material de divulgação - há somente uma alternativa para o manejo da resistência a inseticidas: a cooperação de todos!



Raul Narciso C. Guedes e Daniel B. Fragoso
Universidade Federal de Viçosa

* Este artigo foi publicado na edição número 04 da revista Cultivar Hortaliças e Frutas, de outubro/novembro de 2000.

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