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segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Proteção natural - elicitores bióticos

Os elicitores bióticos têm a capacidade de desencadear uma série de alterações no metabolismo celular vegetal, as quais, em seu conjunto, concorrem para a formação de uma rede de defesa da planta ao ataque do patógeno.

Organismos vegetais encontramse continuamente expostos à ação de fungos, bactérias, vírus ou nematóides patogênicos, havendo espécies suscetíveis e resistentes ao ataque de patógenos, sendo esta última condição a regra. Alguns microorganismos patogênicos apresentam um alto nível de especialização quanto ao hospedeiro, podendo atacar uma espécie apenas, enquanto outros mostram uma ampla gama de hospedeiros.

As plantas possuem mecanismos próprios de defesa em resposta ao ataque de patógenos, os quais incluem, do ponto de vista bioquímico, uma ampla gama de metabólitos primários e secundários. A ativação dos mecanismos de defesa pelos vegetais é um processo iniciado com a percepção do estímulo agressor do patógeno. De fato, os vegetais são capazes de reconhecer a presença de microorganismos patogênicos por meio da detecção de compostos secretados por estes e que interagem, por exemplo, com constituintes da superfície celular vegetal. Tais compostos, produtos do metabolismo primário ou secundário do patógeno, denominam-se elicitores bióticos e têm a propriedade de desencadear uma série de alterações no metabolismo celular vegetal (elicitação), as quais, em seu conjunto, concorrem para a formação de uma rede de mecanismos de defesa da planta ao ataque do patógeno. Como exemplo disto, pode-se mencionar o aumento da síntese de compostos em momentos anteriores (fitoanticipinas constitutivas) ou posteriores ao ataque (fitoalexinas), constituindo uma resposta de defesa química do vegetal à perturbação, cuja natureza é bastante complexa e apresenta peculiaridades para cada combinação planta-patógeno.

Do ponto de vista histórico, os primeiros estudos sobre elicitação foram realizados com o objetivo de elucidar os mecanismos envolvidos nas respostas de defesa de plantas em relação a patógenos ou herbívoros. O princípio da elicitação tem sido aplicado em estudos da associação planta-micorriza, na elucidação de vias biossintéticas de fitoalexinas e como estratégia para aumentos de produtividade de metabólitos secundários de interesse farmacológico em culturas de células vegetais. Esta última abordagem tem sido ampliada e mais intensamente estudada nos últimos anos, por ser um modelo adequado à elucidação de mecanismos regulatórios, a nível bioquímico e molecular, dos processos biossintéticos e de acúmulo de fitocompostos de alto valor agregado em culturas de células.

Os compostos com ação elicitora envolvem enzimas (celulases, hemicelulases e pectinases, e.g.) que determinam a formação de fragmentos de parede celular (oligossacarinas), os quais atuam como elicitores, peptídeos – elicitina e criptogeína, glicopeptídeos, lipídios ou derivados de ácidos graxos e metabólitos secundários (ergosterol e salicilato de metila). De forma similar, o ácido jasmônico e seu derivado metil-éster atuam como compostos envolvidos na via de transdução de sinais ativada por efeito de agentes elicitores, mimetizando a ação destes últimos.

Mais recentemente, devido à importância biológica dos compostos elicitores, a determinação de sua estrutura química, aliada à elucidação dos mecanismos moleculares de percepção destes compostos pelo sistema planta-patógeno, tem sido considerada uma abordagem de interesse tecnológico para o desenvolvimento de novas estratégias de controle de moléstias em plantas.

As respostas de defesa do vegetal poderão ser induzidas por elicitores específicos ou não- específicos. No primeiro caso, os elicitores são produtos de genes de avirulência do patógeno, sendo reconhecidos pelo correspondente produto do gene de resistência específica à raça do patógeno. Como exemplo disto, menciona-se o gene I-2 do tomateiro que exibe um padrão de expressão bastante específico, conferindo resistência à Fusarium oxysporum - raça 2. Os elicitores não-específicos, por sua vez, desencadeiam uma série de respostas de defesa vegetal, como por exemplo a síntese de compostos denominados fitoalexinas, os quais são tóxicos ao(s) patógeno(s). A síntese de fitoalexinas parece ser um dos fenômenos mais estudados no que se refere às respostas de defesa de plantas ao ataque de patógenos. A exposição de células vegetais a estresses de natureza biótica ou abiótica pode resultar em um aumento transiente da produção e/ou do acúmulo de metabólitos secundários específicos para cada espécie vegetal. Assim, por exemplo, as videiras e a alfafa sintetizam a fitoalexina resveratrol e oligômeros deste polifenol estilbênico quando atacadas por patógenos fúngicos .

Cada espécie vegetal provavelmente sintetiza ao menos uma classe de metabólitos quando submetida à elicitação, os quais não são observados na ausência deste estímulo. No entanto, diversos compostos secundários de interesse na bioquímica fitopatológica são constitutivamente produzidos pelos vegetais, não sendo, portanto sensíveis à indução via elicitação.

Nos últimos anos, uma série de trabalhos tem enfocado o isolamento e a análise da estrutura química de fitoalexinas produzidas por diversas espécies vegetais. Os resultados sugerem que, em princípio, é possível considerar que todas as plantas apresentam potencial de síntese destes metabólitos secundários. Adicionalmente, tem sido observado que fitoalexinas produzidas por diferentes membros de uma família botânica, embora raramente idênticas, são estruturalmente relacionadas. Em função disto, a determinação quantitativa de fitoalexinas tem sido sugerida como uma estratégia para avaliação comparativa dos níveis de resistências entre populações vegetais distintas, submetidas à ação de um mesmo patógeno. Neste sentido, as fitoalexinas poderiam ser consideradas como marcadores bioquímicos, atuando como indicadores quantitativos da expressão de resistência de populações vegetais. Como exemplos disto, menciona-se a avaliação da síntese e a distribuição tissular de fenilpropanóides em linhagens de milho resistentes e suscetíveis a Helminthosporium maydis ou a Exserohilum turcicum. No primeiro caso, os resultados demonstraram níveis superiores de síntese e acúmulo do derivado glicosilado do ácido cafeico (cafeoil-glucose) nas linhagens resistentes, logo após a infecção fúngica (13). De forma similar, análises do conteúdo de alcalóides indólicos monoterpenoídicos em tecido seminíferos de Cinchona ledgeriana por cromatografia em camada delgada e cromatografia líquida de alta eficiência, ao longo do período de germinação, indicaram a existência de uma relação inversa entre as concentrações de alcalóides e o consumo de tecidos das sementes por predadores daquela espécie, revelando o efeito destes metabólitos secundários como moduladores de processos de interação ecológica.

Além da síntese de fitoalexinas, outras respostas bioquímicas parecem estar envolvidas na elicitação de células, incluindo o efluxo de eletrólitos através da ativação de um sistema de troca de íons K+/H+ a nível de membrana plasmática, alteração do potencial de membrana e ativação do sistema de oxi-redução da membrana plasmática, gerando espécies reativas de oxigênio. Recentemente, evidências da ocorrência de ligação de elicitores a proteínas de membrana (receptores) tem sido relatadas, bem como a síntese de proteínas relacionadas à patogênese (pathogenesis related (PR) proteins) que constituem um grupo de macromoléculas cujo acúmulo é induzido pelo ataque de patógenos, ou por agentes estressores abióticos (radiação ultravioleta, extremos de temperatura, pH, ácido 12-oxo-fitodienóico, ou íons de metais tóxicos – Al, Cd, Ga, In e La - 17, 18). Algumas destas proteínas apresentam atividade catalítica (b-1,3-glucanases, PR-2 e quitinases PR-3), ou de transporte de membrana (PR-5), porém as funções da maioria das PR permanecem não elucidadas. É sabido, contudo, que estas proteínas interagem com diversos compostos do metabolismo secundário (etileno, ácido jasmônico, ácido salicílico, e.g.), constituindo um ponto de interseção de diversas vias do metabolismo envolvidas na resposta de defesa vegetal ao ataque de fungos patogênicos, por exemplo.

No contexto biotecnológico, os primeiros trabalhos de pesquisa de elicitação em sistemas de culturas de células vegetais utilizavam patógenos em diversos sistemas de co-cultivo. Esta abordagem não se mostrou viável e, posteriormente, foi demonstrado que homogenatos de microorganismos tais como fungos (Phytophthora megasperma, e.g.) e bactérias (Pseudomonas aeruginosa, e.g.) eram igualmente efetivos como elicitores, passando a ser utilizados em substituição ao patógeno intacto. Diversos relatos na literatura demonstram o sucesso desta estratégia no aumento da produção de compostos bioativos de interesse farmacológico em culturas de células e tecidos vegetais. Os sistemas de cultivo in vitro têm demonstrado que respostas diferenciais em termos quantitativos e qualitativos podem ser encontradas, quando culturas de células vegetais são elicitadas com um patógeno específico. Estes resultados sugerem que a eficácia do tratamento com um dado elicitor depende de uma série de fatores e que a resposta de indução é restrita a determinadas vias biossintéticas. Assim, a escolha correta do agente de elicitação é de fundamental importância, não havendo regras que possam indicar qual a melhor combinação elicitor/espécie vegetal que deverá ser utilizada. Além disto, a concentração do elicitor, a idade das culturas, o momento de adição do elicitor ao cultivo, o período de contato entre as células/plantas e o elicitor e as condições nutricionais são fatores que precisam ser considerados quando se busca delinear um estudo neste contexto. Adicionalmente, a interpretação de resultados de trabalhos de investigação deverá considerar o efeito de cada um dos fatores acima mencionados, diminuindo a possibilidade de geração de conclusões errôneas, principalmente quando baseadas em extrapolações de resultados obtidos em sistemas de cultura in vitro para condições de cultivo ex vitro.

Em função do exposto, o emprego de agentes elicitores como ferramenta tecnológica objetivando reduzir ou evitar a utilização de agrotóxicos nas práticas fitossanitárias parece ser, na maioria das vezes, uma possibilidade que depende do aprofundamento do conhecimento das relações planta-patógeno para sua concretização. No entanto, ao longo dos últimos anos, os estudos de elucidação dos mecanismos envolvidos na interação patógeno-hospedeiro têm alcançado resultados promissores, notadamente devido aos avanços nas áreas do conhecimento da bioquímica e da biologia molecular. Os progressos alcançados nestas áreas do conhecimento fundamental têm contribuído de forma decisiva para a redução do tempo necessário à elucidação e identificação de etapas limitantes de vias metabólicas primárias e secundárias envolvidas em processos de defesa de plantas ao ataque de patógenos. Como resultado disto, um crescente número de genes de resistência e seus mecanismos de regulação têm sido identificados/elucidados, viabilizando um aumento no número de genes clonados. Este quadro tem contribuído decisivamente para expandir as possibilidades de aplicação da engenharia do metabolismo como uma ferramenta de grande potencial em processos de obtenção de variedades resistentes ao ataque de microorganismos patogênicos, por exemplo.

A utilização de técnicas biotecnológicas acopladas a métodos clássicos de melhoramento genético vegetal é uma abordagem de interesse, quando se busca a otimização de sistemas de cultivo com base no desenvolvimento de variedades resistentes a patógenos, pragas, ou ainda tolerantes à ação de herbicidas. Neste contexto, uma série de esforços têm sido feitos com o intuito de otimizar a resposta de espécies vegetais ao ataque de microorganismos patogênicos, utilizando diversas estratégias da engenharia genética. Como exemplo disto, a clonagem de genes que conferem resistência ao hospedeiro, ou induzem/intensificam a expressão de vias de expressão de mecanismos de defesa pré-existentes neste, tem sido adotada. Esta abordagem considera, portanto, a identificação de características de interesse em um dado sistema planta-patógeno e sua posterior transferência para outro sistema, permitindo que o hospedeiro transgênico defenda-se com sucesso do ataque de um patógeno anteriormente letal.

Contudo, o desenvolvimento de variedades resistentes sob este enfoque tem encontrado algumas dificuldades, na medida em que a expressão dos genes de resistência pode não ocorrer no hospedeiro, ou se dar de forma transiente. Uma possível causa para isto poderá ser a não funcionalidade da via metabólica envolvida na resposta de defesa da planta ao patógeno. De qualquer modo, tais obstáculos advêm do pequeno conhecimento que se tem sobre os fenômenos que regem a interação patógeno-hospedeiro, notadamente no que se refere às vias metabólicas envolvidas. Neste contexto, estudos de respostas in vitro e ex vitro de plantas a elicitores têm contribuído para o descobrimento e elucidação das interações a nível molecular entre plantas e microorganismos patogênicos - indução de receptores de superfície celular e mecanismos de transdução de sinais, por exemplo. O entendimento destes fenômenos em bases bioquímicas e genéticas contribuirá, em alguma extensão, para otimizar os processos de desenvolvimento de variedades resistentes à estresses ambientais, através do uso de abordagens metodológicas mais eficientes.

Marcelo Maraschin,
UFSC
Robert Verpoorte,
Leiden University / Holanda

* Este artigo foi publicado na edição número 36 da revista Cultivar Grandes culturas, de fevereiro de 2002.

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